O aCena Recifense entrevistou Iury Andrew, DJ e produtor cultural olindense que é um dos principais nomes da cena pernambucana. O artista nos contou um pouco sobre sua trajetória, referências, projetos, conquistas e planos para o futuro. Confira!
1. Quando a música surgiu na sua vida e em que momento você decidiu em lidar com essa expressão artística de maneira profissional?
R: “A música sempre esteve muito presente em minha vida. Ainda criança, já estava em meio de rodas de samba organizadas por meu tio e seus amigos. Todos em casa consumiam musicas diariamente. Discos, CDs e DVDs de diferentes gêneros. É daí que vem toda minha bagagem musical que é grandiosa. desde o brega romântico ao rock internacional, desde o hip-hop até as manifestações regionais como frevo e afoxé. Da MPB, Samba, ao POP. Me considero uma grande biblioteca musical, conheço de tudo um pouco, sério! Também sempre fui muito curioso e gostava do universo artístico, já me via ali. Se me perguntassem o que eu queria ser quando crescesse, eu responderia diretamente, sem pensar: ATOR. Ainda cheguei a fazer teatro, mas a música começou a tomar meu tempo. Com 18 anos eu já havia tido alguns contatos com as CDJs e ali foi se criando organicamente um gosto pela coisa, que começou como forma de ajudar os amigos produtores independentes. Mas foi com a demissão do meu emprego na época, com um ato racista Do clichê: ‘ou corta o black power ou se manda’, que decidi me mandar e focar em algo que tanta gente falava que eu tinha futuro. Mesmo com medo, segui batendo de porta em porta e conseguindo um espaço que na época ainda era difícil para a diversidade de corpos, gêneros e raça, mesmo que ainda no meio LGBTQIAPN+. Existiam bolhas de qual eu não fazia parte e fura-las foi difícil, mas não tinha pra onde.. eu era BOM e uma novidade interessante.”
2. De que forma a sua vivência na periferia de Olinda moldou o seu eu artístico?
R: “Cara, crescer na periferia me fez ter referencias que eu jamais teria crescendo em um condomínio. Eu via minhas primas mais velhas ensaiando para covers de bandas de brega que brilhavam na TV nos anos 00’s. Eu estava no meio de ensaios e arraiais de quadrilhas juninas que minhas vizinhas dançavam, ajudava nas confecções de seus figurinos. Vi muitas bandas em showmícios, blocos de carnavais na porta de casa. Estudar em escola da periferia que nos incentivavam a criatividade em apresentações escolares nas quais eu sempre estava de frente ou envolvido. Ver amigos tentando sucesso como MC produzindo Funk de galera. Eu tive a sorte de ter nascido em peixinhos, onde nasce também Nação Zumbi. O bairro naquela época era referência em arte no estado. Então eram inúmeras manifestações artísticas inspiradoras. Dança, teatro, audiovisual, grupos populares, música. Peixinhos segue me inspirando e sigo bebendo desta fonte até hoje. Vejo muito da periferia no que faço, não só na minha presença, mas na minha pesquisa musical. Eu posso estar fazendo um show em uma exposição de arte em sei lá, Paris.. mas ainda sim você vai sentir Peixinhos e Olinda ai, eu darei um jeito de coloca-las ali rs”
3. Para além de suas vivências pessoais, o que mais inspira e molda seu trabalho? Quais são suas principais referências e sonoridades exploradas por você em seus sets?
R: “Acredito que a cultura pop e a cultura negra me moldaram. Antes de ser gay eu já era pop, e antes de ser preto eu já bebia da fonte de toda a musicalidade negra. Então antes de qualquer letramento, eu já tinha grandes referências na musica internacional e PRINCIPALMENTE na musica nacional. Hoje minha maior referência segue sendo a música preta periférica e a cultura queer. A inspiração vem do meu cotidiano, dos meus amigos, dos meus parceiros de trabalho,,. Ver uma galera que vem da mesma geração que a minha quebrando tudo e também conseguindo espaço é uma grande fonte de inspiração. Assim também como as diversas culturas que venho conhecendo com as viagens. Tudo isso me traz ainda mais bagagem e deixa tudo ainda mais gostoso na hora de fazer um som.”
4. Nos últimos tempos você tem rodado o Brasil com o seu trabalho, incluindo participações em festivais de grande expressividade como o Psica e Afropunk. Como tem sido se ver alcançando tais espaços?
R: “Quando eu paro pra lembrar que já fiz quase todos os festivais do estado e que venho alcançando espaços em outros eixos, como o sudeste e o norte, me encho de orgulho, porque eu sempre trabalhei sozinho em tudo. Sempre fui minha EUquipe . AGORA, tenho um assessor para publicidade, mas sigo sendo meu próprio agente como DJ, o que é muito cansativo. Ter alguém pra cuidar de você te blinda de certas frustrações e humilhações rs. Mas eu também aprendi e ainda aprendo muito com isso. De certa forma é muito legal também conseguir e pensar ‘PORRA!! Eu que fiz isso acontecer, não foi ninguém. Fui EU’. E sempre foi assim. Todos os festivais, grandes eventos, turnês… eu que fecho tudo. Vou lá fazendo trabalho de formiguinha, me apresentando, mostrando meu trabalho, mostrando o carisma do pernambucano (rs), insistindo… São vários nãos, mas muito orgulhoso dos vários sins. Eu nunca imaginaria que percorreria por quase todo Nordeste sendo DJ, que ganharia respeito no Rio e SP e que teria Salvador como segunda casa. Eu meio que normalizei tudo isso, mas quando estou pra baixo eu abro meu release e penso: ‘Você é babado meixmo, né?’. Fico impressionado que ao longo desses anos eu já toquei em tudo que é tipo de evento e nunca foi sobre ter patrocínio, berço ou precisar babar ninguém.”
5. Como surgiu o Baile do Andrew e como está sendo produzi-lo?
R: “O Baile do Andrew surge após a minha primeira produção, que foi meu aniversário de 23 anos, na rua, antes da pandemia. Histórico. Ali eu estava no meu auge criativo e vivendo um sonho. Meu rosto estava em todos os flyers e eu estava vendo que era possível. Logo depois veio a pandemia, que me fez me desestruturar todo, porém já no final dela veio a ideia de produzir novamente um aniversário, dessa vez como um grande baile para comemorarmos nossas vidas. Assim nasceu o Baile do Andrew, em Calhetas. Foi um festão que até hoje quem compareceu comenta. Em 2023, quis produzir algo maior e pedi a parceria da Golarrolê, que sempre me apoiou. Assinei toda direção criativa e artística do Baile e eles entraram com toda estrutura e burocracia. Ano passado resolvi não fazer por motivos pessoais, mas este ano teremos novidades. Quero que o selo seja maior do que uma festa, que tenhamos outras possibilidades para a nossa comunidade através dele.”
6. O que podemos esperar do futuro de Iury Andrew? Quais são as metas, planos e projetos que podem ser compartilhados com o público?
R: “O artista Iury Andrew, para além da discotecagem e produções (quero muito produzir mais eventos!), quer também explorar outras expressões de arte. Retomar o sonho antigo que falei sobre o teatro e também estudar sobre produção musical. Quero levar a nossa cultura para além das fronteiras, levar o brega funk pro mundo. Acredito que Pernambuco já se tornou pequeno, por mais que eu o ame e já já o Brasil também se tornará. Já o Iury Andrew pessoa pensa muito sobre levar uma vida mais tranquila daqui há alguns anos. ser universitário, casar, ter filhos e todo aquele papo de artista que ama ser artista, mas que também adoraria viver uma vida mais normal. Mas até lá, vocês ainda me verão muito por ai, seja nos palcos ou quem sabe, nas telinhas. Eu já tentei fugir da arte, mas ela me tem nas mãos. Eu realmente amo tudo isso e não me vejo sem ela e mesmo que um dia eu me canse, ainda estarei realizando sua manutenção, pois ela é um dos meus sentidos pra vida.”